domingo, 19 de setembro de 2021

A um deus que talvez exista

Se Deus existe, então que ouça estas palavras.

O facto de eu ser um segredo para mim mesmo não é segredo para ninguém.
Na verdade, a ignorância sobre mim próprio é natural, porque tanto em mim é potencial.
Não consigo expressar parte daquilo que sou, não consigo falar daquilo que se está por realizar.
Parte de mim é o futuro em mim, e sobre isso não sei muito.

A ignorância sobre mim próprio não me impede, no entanto, de ter algumas certezas.
Elas são, por assim dizer, a substância do meu ser, e do sucesso e da ruína que está por vir.

Falo primeiro da minha postura quanto à realidade física, à natureza, ao universo onde habito.
Sou um explorador da natureza, por natureza, pois é nela que me perco e me encontro.
Mas a verdade revelada na exploração nem sempre é uma benção.
Mas se é a verdade, tenho a certeza de que existe nela uma certa beleza.
A minha vontade de encontrar a verdade é pura, apesar de eu próprio não o ser.
E se há poder na verdade, sou capaz de o usar e, quando necessário, dele abdicar.

Quanto à condição humana, é-me difícil expressar, por isso dou exemplo.
Ao Homem que faz Mal, não serei um santo, pois não sou santo em geral.
Mas quando sobre ele tudo se abate, tão extremo o seu sofrimento,
e tão desnecessário - sinto um aperto. Sou um coração mole,
mas também o Sol é mole, e não arde menos por isso.

E se o que arde violentamente for mole de coração?