sábado, 4 de março de 2017

Os Frutos não nascem podres. [texto de 2012].

As Batalhas não decidem a Guerra, e os Frutos não nascem podres.

É como tentar remar contra a corrente. Quando se toma a decisão de lutar, está-se inevitavelmente destinado a encontrar obstáculos. Não há evolução sem desafios, é como tudo. Está-se destinado não só a sofrer, como provavelmente a perder batalhas atrás de batalhas. Dizem que batalhas perdidas não decidem o desfecho final da guerra... Mas quantas batalhas temos de perder até ficarmos aptos o suficiente para ganhar? Quanto sangue temos de derramar, nosso e alheio? Quanto cansaço acumula? Quanta esperança morre? Tanta esperança morre... Morre e renasce, demora a renascer, demora a morrer, tudo ao mesmo tempo. Existem momentos de glória, pequenas batalhas são ganhas, batalhas que, apesar do seu tamanho, nos enchem de triunfo e esperança, mais do que poderíamos esperar duma batalha tão pequena. O sol vai e vem, alterna com a lua, como se não houvesse espaço para os dois lá em cima; sempre foi assim. As tempestades vão e voltam... os fortes alimentam-se dos fracos. Os fortes e fracos lutam com fracos e fortes, e as guerras continuam, tal como o sol, a lua, e as tempestades, e o sangue, e a vida e a morte.

O mundo está para além do bem ou do mal. Somos um misto, um misto de bom e mau, de quente e acolhedor, de frio e inóspito. Somos um misto dentro de um misto. Bem, se uma fruta está metade podre, chamamos-lhe “fruta podre”. “Está podre”, dizemos com toda a certeza. Bem capaz. O que eu costumo fazer com essa fruta é cortar a parte podre antes que se alastre a corpo inteiro, antes que contamine as irmãs, as vizinhas, as sementes. A podridão alastra-se, e quem não vê, consegue certamente cheirar, esse cheiro horrendo a morte. Isto falando de frutas é claro. Falando de pessoas, bem... Como se corta o podre? As pessoas são feitas de carnes e osso, de tecido e nervos, de corpo e alma. Não existe uma faca que corte alma, mas existem armas que cortam pessoas. Existem armas que acabam com o corpo das pessoas, e a alma e o podre desaparecem por não ter onde se agarrar. Já que não se pode cortar só o podre, acaba-se com a pessoa por inteiro. Vai tudo à vida. Oh, mas sejamos sinceros, existem armas que cortam especificamente o que interessa ou não interessa, sim. Armas que podem fazer bem ou mal, mas são demasiado difíceis de manusear, que são mal usadas, ou usadas em pessoas erradas, ou por pessoas erradas, e que acabam por alastrar o podre. O que se faz? Tenta-se extrair o podre usando as armas certas, ou entra-se em guerra e destrói-se tudo por completo. Destrói-se tudo por completo, a outra opção é demasiado arriscada, é demasiado difícil, demasiado.

Mas porquê temer a podridão alheia quando já temos suficiente da nossa? E de armas na mão, as guerras começam, e o cheiro a morte e a podre alastra. E o sangue derrama, e a esperança morre, e renasce, e demora a renascer e a morrer. Enchemo-nos de glória por pequenas vitórias ganhas, e suores frios escorrem pelo corpo cada vez que uma batalha ameaça ser perdida, e o cansaço acumula. O sol brilha num momento, e depois não, e as tempestades vão e vêm.

E a árvore nunca apodrece, e os frutos nunca nascem podres.